segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

A HÉLÈNE E O TAGORE


"Si j'avais eu la conscience suffisamment claire et les mots suffisamment nuancés pour l'exprimer, j'aurais aimé te dire que nous sommes là pour explorer, découvrir et partager ce qu'il y a de meilleur en nous. Chacun possède un trésor. Sois conscient et généreux de ton trésor et, en même temps, reste ouvert, attentif à recevoir le trésor des autres, disposé à apprendre et à te remettre en question. Cherche la beauté, la vérité, l'excellence en accueillant aussi ta fragilité, ta vulnérabilité et ton ombre, de sorte d'être à même d'accueillir celles des autres. Occupe joyeusement ta place: il y a de la place pour chacun, sinon ni toi ni moi ne serions là. Pense que ta place que tu n'occupes pas pour ne pas déranger reste vide à jamais et réjouis-toi que chacun occupe pleinement la sienne autour de toi ." Rabindranath Tagore (1861-1941)

A Hélène pôs este poema do Tagore no blog dela (não consegui encontrar a tradução para português) e disse que ao lê-lo se lembrou de mim. Fiquei sem palavras porque o texto é brutal. Vale a pena perder 3 minutos a tentar decifar o francês.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

A NOSSA CASA!!



Para os mais curiosos e porque prometemos vivamente fazer boa publicidade, aqui vai a nossa recomendacao ao Tourist Inn! Esta muito bem situado na Sudder Street (para quem nao fica muito tempo, e a rua perfeita para os voluntarios com bons restaurantes, nets, ao lado do mercado, etc). O hotel nao e muito barulhento, e estava muito limpo (pelo menos durante os 2 primeiros dias porque compramos lixivia e detergentes e limpamos a seria!). Ficamos num quarto triplo, com duas janelas e imensa luz (embora so conseguissemos ver luz a hora do almoco porque as 5h30 era noite escura e as 19h idem!), wc so para nos e agua quente com balde! Muito bom!!

sábado, 5 de dezembro de 2009

O NOSSO DIA A DIA...

NAMASKAR!!

Antes de mais, muito obrigada pelos comentarios e palavras de incentivo ao blog!! Para alem dos 22 seguidores oficiais, e bom saber que algures por ai, alguem vai acompanhando as nossas desventuras pelas Indias, por isso cometo a loucura de estar a escrever as 22h30, quando ja devia estar no meu segundo sono. Mas nao resisto.

Ja tenho um outro post a meio a contar-vos um dia especialmente marcante, mas nao faz sentido nao contar primeiro o nosso dia a dia. A missa na Mother House (opcao para os voluntarios) e as 6h da manha. Como estamos a "viver" na Sudder Street, rua onde se instalam a maioria dos voluntarios, com restaurantes, nets, perto do mercado, etc, isso significa que temos de acordar no maximo as 5h20, para sair de casa as 5h35 e ir a passo rapido para la chegar la em cima da hora. Embora seja puxado, para alem dos dias de folga, fizemos o esforco de nao faltar porque e realmente o que da forcas e sentido ao que estamos aqui a fazer. A caminhada e tranquila de manha; ha poucas pessoas aquela hora da manha, muitos mendigos dormem nas ruas, os taxis vao parando a perguntar se queremos ir para a Mother House (seremos os unicos turistas que estamos acordados as 5h30 da manha a andar pelas ruas de Calcuta) e claro, ate mesmo os taxis tem as luzes dos farois multicolores (parecem um arco-iris!!) - isto e real!! Em vez de iluminarem a estrada, parece que estao a decorar a mesma. E ainda dizem que este e um povo triste...

Depois da missa, rezamos com as Irmas varias oracoes. E sim, impossivel nao nos perguntarmos o que e que tamos aqui a fazer, mas depois de rezarmos, tudo parece serenar... Aqui fica a que mais me tem marcado.

Radiating Christ
Dear Jesus, help us to spread your fragrance everywhere we go. Flood our souls with your spirit and life. Penetrate and possess our whole being so utterly , that our lives may only be a radiance of yours. Shine trough us, and be so in us, that every soul we come in contact with may feel your presence in our soul. Let them look up and see no longer us but only Jesus! Stay with us, and then we shall begin to shine as you shine; so to shine as to be a light to others; the light O Jesus, will be all from you, none of it will be ours; it will be you, shining on others through us. Let us thus praise you in the way you love best by shining on those around us. Let us preach you without preaching, not by words by our example. By the catching force, the sympathetic influence of what we do, the evident fullness of the love our heart bears to you. Amen.

Pelas 7h, as Irmas oferecem um pequeno almoco aos voluntarios de Tchai, pao e bananas. E sobretudo um bom momento de convivio, embora estejamos todos ensonados. As 7h30, somos todos enviados para as diferentes casas. A Tete ficou a trabalhar de manha em Dayan Dan com criancas deficientes, e a Zezinha e eu ficamos em Shanti Dan, uma casa que acolhe mulheres com problemas mentais, mas tambem algumas criancas retiradas as familias. A Zezinha e eu estamos a trabalhar, juntamente com a Helene, voluntaria francesa, com as cerca de 15 criancas, e tem sido um trabalho muito desafiante. Primeiro porque a maioria das criancas nao fala ingles, depois porque tem idades muito dispares, entre os 3 e os 11 anos, logo acaba por ser um desafio quotidiano pensar em actividades paar os miudos e ir trabalhando com eles atraves do tom de voz e da linguagem gestual. Ao fim destes dias em Calcuta, este trabalho que me desanimava ao principio, comeca agora a dar frutos. As criancas comecaram a ganhar-nos respeito, e comecamos a ver uns pequenissimos frutos que nos enchem por dentro. E claro, nao lhes podemos mostrar, mas babamo-nos todas quando nos chamam a toda a hora "Auntie, Auntie!" ou quando os mais pequenos depois do intervalo da manha comecam a chuchar no dedo e nos adormecem ao colo. Acho que temos vontade de levar varios connosco...

Pelas 11h30 vimos para casa, almocamos num dos restaurantes da Sudder St. (o famoso Blue Sky) que e a nossa casa de jantar ou noutro qualquer; tentamos dormir entre 10 a 20 minutos (se antes nao passamos no mercado!!) e ala para as casas da tarde! A Zezinha vai para Shishu Bavan onde trabalha com criancas deficientes, e eu vou para Kalighat, uma casa para doentes moribundos. Embora esteja a acompanhar doentes terminais (e nao so), e incrivel o que estas doentes se parecem por vezes a criancas, de tal forma se tornam dependentes de nos para tudo. Tem sido um privilegio poder acompanhar mais de perto algumas destas vidas e diariamente poder dar-lhes o jantar, fazer-lhes massagens ou por-lhes perfume solido (Mae - grande utilidade estou a dar-lhe aqui!!). Por outro lado, e impressionante a fragilidade da vida humana, da Manjuri que ha 4 dias comia devagarinho, que ontem ja nao quis beber o leite e se encostou no meu braco e adormeceu encostada a mim como um bebe e hoje ja estava ligada a soro. Claro que nos questionamos ate quando ira ela lutar, qual o sentido da vida para esta mulher, qual a causa de tanto sofrimento?

A tarde voa, com ela pode vir a Adoracao na Mother House, um encontro com voluntarios ou uma outra qualquer actividade; tomar banho com balde (amanha mostro a nossa casa!!), decidir onde jantamos e de repente hora de dormir...

E com isto, os nossos dias em Calcuta voam e rapidamente tem 16 horas...

NAMASKAR!

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

UM DIA DAQUELES...

Hoje fica a descricao dum dia que nao quero esquecer. Dum dia que me marcou a todos os niveis. Ironia do destino, perdi o meu diario de Calcuta num autocarro. Aquele caderno onde tinha oracoes, mails, pensamentos, contactos, enfim, apercebi-me que a escrita e a fotografia sao para mim essencias para nao esquecer. Para perpetuar tudo aquilo que sinto em cada momento e me ir lembrando. E por isso, aqui fica o pouco que me lembro deste dia fortissimo...
Acho que foi domingo passado. Depois da missa as 6h, fui para Prend Am com a Joan, porque tinhamos uma visita especial a meio da manha. Nesse dia, lavar as roupas durante 1h30 custou-me bastante. Estava ainda cansada da ultima desinteria (tinha ficado na vespera em casa doente), e estar aquele tempo de pe a lavar roupa foi puxado. Pelas 10h, fui ter com a Joan a ala masculina, onde ela estava a fazer um curativo a um doente e deparei-me com uma cena impressionante... O que a Mafalda me tinha descrito em tempos em Lisboa e me tinha comovido e quase que enojado, ganhou forma nessa manha em Prend Am. A Joan estava com dois voluntarios franceses (enfermeiros) a tratar da ferida dum doente, que tinha a cabeca aberta cheia de vermes e uma enorme ferida aberta que podera ser um cancro. Fiquei com o coracao apertado, sobretudo pelo sofrimento silencioso deste homem que apertava as duas maos, uma contra a outra, totalmente mudo... Quando pedi a Joan se podia ajudar, dando-lhe a mao por exemplo, ela pediu-me antes para ir desinfectar os instrumentos medicos. Claro que me vim completamente abaixo, sem conseguir entender ou aceitar tamanho sofrimento. E no meio disto questionava-me se no tratar podemos amar; se no amar podemos tratar; se podemos fazer os dois ao mesmo tempo e em que medida... Mais tarde, um dos enfermeiros que esteve a tratar esse doente veio ter comigo impressionado por nunca ter visto nada assim.


Parti entao com a Joan de comboio (deixo-vos a fotografia porque tambem vale a pena ver!) para a visita da manha, onde finalmente ia conhecer o Suku. A Pipa Roncon sera a melhor pessoa para contar a historia do Suku (Pipa, fica aqui o desafio para contares num post a versao completa e correcta!!). O que e que vos posso contar sobre o Suku? Que e um rapaz de 10 anos que a Pipa conheceu em Calcuta ha um ano e meio e estava acamado, com uma tuberculose gravissima nos ossos, paralisado. Gracas ao contacto e empenho da Joan, a uma campanha incansavel de angariacao de fundos da Pipa e a dedicacao dum neurocirugiao formidavel, deu-se um milagre no mundo da medicina e este miudo consegue hoje andar e dancar!! Embora nao se veja na fotografia, o Suku e um rapaz espirituoso, alegre e tem a sorte de viver numa casa (das Irmas da Caridade) onde e adorado por toda a gente. Esta foi mais uma ocasiao para dar gracas por aqui estar, por ter conhecido a Pipa, a Joan, o Suku e ter participado neste "miracle of love" como eles dizem. Fica aqui a fotografia do Suku a dancar para nos e para a Pipa!

Por outro lado, o ter passado a manha nesta casa foi um privilegio e um presente de Deus depois da manha dura. Por ser uma casa mais pequena e fora do centro de Calcuta, as Irmas nao recebem normalmente voluntarios e adoraram receber a visita da Joan (e minha, por arrasto)! Acolheram-nos lindamente, sempre com imensas atencoes, e sobretudo com tempo para estarem connosco e para conversarem, o que geralmente nas outras casas nao acontece muito porque estao sempre muito atarefadas com trabalho. A festa e o entusiamo chegaram ao ponto de a dada por iniciativa das Irmas, elas me terem vestido com um saree!! Olhem para nos!!! Foram as proprias Irmas que me vestiram de uma ponta a outra! Pareciam criancas a brincar com uma boneca!


Nessa tarde ainda fui para Kalighat, o que foi optimo, porque embora tenha chegado mais tarde ( tuc-tuc partilhado com 8 pessoas!!, comboio, outro tuc-tuc e mais 15 min a pe), estavam poucas voluntarias e dediquei-me mais a Ratna e a Maravi. Embora o tempo em que ca estamos seja curto, preocupamo-nos e ligamos-nos mais a algumas doentes e no momento em que vos escrevo, a doente que estava muito mal em Kalighat, a Maravi (nao sei se confundi o nome dela com o da Maya ou da Manjuri) morreu naquela mesma madrugada em que vos escrevi. Foi realmente um privilegio poder estar perto dela nas ultimas semanas da sua vida, te-la adormecida nos meus bracos e ve-la partir de tanto sofrimento. Nao deixa no entanto de ser duro... E estes sao os que sao protegidos aqui neste imenso mundo de Calcuta.

Acabei a noite a beber Tchai com o Peter, voluntario frances, e com o Richard de cabelo branco(que dorme na nossa rua) e o Kalu (taxista que nos levaria a Cidade da Alegria). O Peter veio ca pela segunda vez e desta vez, passava as tardes a conversa com o Richard e o Kalu que sao duas pessoas verdadeiramente excepcionais.

A INTENSIDADE DOS DIAS EM 5 SENTIDOS


A todos os que nos teem acompanhado... Sei que ja o disse varias vezes, mas isto de escrever num blog e bastante mais impessoal do que escrever por mail.



1) nao faco ideia de quem me esta a ler;

2) nao faco ideia se estao a acompanhar com regularidade ou se ja se fartaram da falta de periodicidade com que aqui venho;

3) como nao tenho feedbacks (so agora e que descobri que tinhamos tido comentarios!!!), para mim e meio estranho. De qualquer forma, sem promessas, vou tentar ser mais fiel.

Os dias sao vividos com uma intensidade imensa. Impossivel de descrever, diria que na India, todos os nossos sentidos sao apurados.



Nao so a visao com as imensas cores, as poses dos indianos, os olhares das pessoas; como a audicao com as musicas na rua, a cacofonia no transito, lavarem as panelas dos restaurantes por baixo das janelas do nosso quarto ate adormecermos, acordarmos as 5h com o chamamento para a mesquita ou foguetes em dias de casamento (fomos no outro dia a um casamento muculmano e foi uma loucura!) e fenomeno curioso, os caes, que sao aos milhares e dormem, indiferentes a imensa barulheira das ruas, sao tao pacificos e tolerantes como o seu povo: nunca os ouvi ladrar.
Os cheiros sao intensissimos: tanto podemos cheirar o tchai como as especiarias, como temos de aguentar a respiracao porque um cheiro a esgoto ou a mijo se nos entranha no corpo. O paladar tem sido uma conquista neste imenso continente. Ja estive segunda vez doente (desculpa para longa ausencia da internet), nao sei bem porque... Bastante desgastante, mas estou contente, porque estou bem ha 4 dias, e so fiquei um dia em casa! Aos poucos, vamos-nos aventurando nos paneer, nos tekalis e curries. Comida de rua, muito devagarinho, porque claro, e sempre picantissima! Ha por outro lado imensos restaurantes que servem comida ocidental e chinesa (noodles, etc) por isso e facil de nos defendermos e os Nans (pao tipico) sao regra geral deliciosos!
E claro, o toque, eu que sou a senhora do toque, habituei-me neste novo mundo a juntar as duas maos e fazer um singelo Namaste e a evitar dar apertos de mao, que para eles e ja considerado um gesto de grande intimidade. Os indianos olham para nos com imensa curiosidade, sobretudo quando estamos em partes da cidade pouco turisticas; nao se coibem de nos interromper se estamos a meio de uma conversa: "Excuse me! Excuse me! Which country? What language?" Os mais cerimoniosos olham para nos com imensa curiosidade e tentam tocar-nos (esses sao atrevidos!). Nas casas onde trabalhamos, o simbolo de maior respeito, e darem-nos um beijo nas maos e logo em seguida nos pes. Ficamos sem reaccao...